frescos anos, em cerne e alma
breve, me transmudam
praia a
praia em largo mar.
corro
maresias transumantes
eu, mestiço de mim,
e me cresço
em gomos de tacula.
verdes
anos, em carne e alma
leve, me transladam
costa a
costa e mesmo mar.
colho
rosmaninhos transmontantes
eu, bi-ego de mim,
e renasço
em ritos de carqueja.
no ver e no
ler
eu canto
sempre
búzio
ou zimbo
e crio no
peito
laivos de
múcua enclausurados
e domo no
peito
travos de
mel amendoados.
pela xana,
de palavra branda
vão os dias
do cacimbo
no montado
as formigas abrem alas
que do maio
há já caminho:
saber
sentir
entre os
dedos d’uma mão
o fio mel
da cereja,
saber
sentir
entre os
dedos d’outra mão
o fio gel
da gajaja
é ser
fruto e
alma.
e da alma
a memória
desagua em
corpo
kákulu
e kábassa
gémeo de mim.
Admário Costa Lindo
o bico-de-lacre e o tarrote
(dos pássaros sem fronteiras e do
bicho careta)
II – o livro dos bicos-de-lacre
- inédito -
notas:
CACIMBO. kimbundu. Humidade
própria dos climas tropicais e equatoriais; época do frio, que decorre entre 15
de Maio e 15 de Agosto.
GAJAJA. tupi e kimb. Fruto
comestível da gajajeira, Spondias mombin,
muito aromático e de sa-bor agridoce.
KÁBASSA. kimb. O gémeo que
nasce em segundo lugar.
KÁKULU . kimb. O primeiro
gémeo a nascer.
MÚCUA. kimb. Fruto do
imbondeiro.
TACULA. Pterocarpus tinctorius, árvore de cerne vermelho coral; um pó
preparado com a ser-radura é utilizado em ritualismo.
XANA. utxokwe. Anhara. Planície
arenosa, correspondente africano da charneca, na região central de Angola,
atravessada por cursos de água, com vegetação rasteira formada principal-mente
por gramíneas e arbustos de pequeno porte, podendo apresentar-se alagada.
ZIMBO. kikongo. Olivancillaria nana. Búzio, molusco
gastrópode. A primeira moeda de troca angolana. O zimbo ou jimbo (kimbundu) era
apanhado na ilha de Luanda, propriedade do Rei do Congo e escolhido por
tamanhos, do que dependia o seu valor “facial”.
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